Joy Division no último volume, centenas de maços de cigarro no sofá e algumas xícaras de café em cima da mesa central. De fato, essa era a nova decoração da casa de Pámela.
Passava dias isolada. Não via ninguém. Não queria saber de quem fosse. A única coisa que desejava era ficar sozinha.
Trocou os amigos pelos vícios, a vida social pelo isolamento. Mentiu para o namorado dizendo que viajaria e não atendia mais os telefonemas de seus familiares. Simplesmente se desligou do mundo acreditando que tais decisões resolveriam todos seus problemas.
Como já não trabalhava mais, as contas começaram a acumular. Vivia de prazos. Prazos para pagar a energia, o gás, o condomínio, a água. Tirava dinheiro de onde não tinha. Chegou até a vender alguns móveis para poder se manter.
Aos poucos foi perdendo tudo. O telefone não tocava mais, não havia uma mensagem sequer na secretária eletrônica. Assim, notou que a família realmente tinha desistido dela – algo que sempre desejou.
Entre desejar e se tornar real há um espaço muito grande. Pámela, de fato, não soube lidar com isso e piorava cada dia mais. Começou a escrever cartas destinadas a um desconhecido qualquer.
Usava sempre a primeira pessoa, era sempre um homem. Um homem destinado a sofrer pela vida inteira, que não encontrava a redenção nem em si mesmo. Mas que sabia viver e que era capaz de tudo para mostrar um caminho oposto do que vivia através de suas palavras.
Em uma madrugada gélida, depois da milésima carta, decidiu que iria embora de verdade. Iria embora para se reconstruir. Abandonou o apartamento e as poucas coisas que sobraram dentro dele. E deixou todas as cartas que escreveu na caixa de correio para que o próximo morador pudesse ler.
Passou na casa dos pais, visitou os amigos. Explicou exatamente o que tinha acontecido e levou consigo somente as roupas do corpo. Não sabia exatamente quando voltaria, mas descobriu em um dia o que demorou a vida inteira para descobrir: era amada e aceita por todos ao seu redor.
- Ah! Quanto às cartas... elas caíram nas mãos de uma pessoa muito especial. Mistério.
Um comentário:
Há sempre tanto a ser mudado, há sempre tanto a permanecer intacto. É como uma cidade belíssima onde todos os homens sejam criminosos: prendam os homens, deixem a cidade inteira.
Temperança... as suas palavras, ditas de maneira simples, me inspiram a ter temperança, equilibrar essa minha vida que vive em frangalhos, encontrar a justa medida entre ter, ser e estar.
Nilton
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