
Assim como brincávamos quando éramos crianças, tapou meus olhos com as mãos e logo me perguntou o que eu enxergava sem realmente poder ver. Esperava que minha resposta fosse “nada”, só porque já estava bem mais velha desde a última vez que fizemos isso.
“As pessoas crescem, mas não deixam de enxergar com o coração”, respondi. E fui dizendo, em seguida, que via um gramado bem verdinho com um jardim bem bonito e bem florido. Que mesmo com os olhos tapados, conseguia ouvir o canto dos passarinhos, o barulho da cachoeira que tinha por perto e várias vozes que, unidas, eram impossíveis de reconhecer.
Notando que comecei a sorrir, quis saber por que parei de falar. “É que vejo meus amigos, minha família, e você não vai acreditar: estou me vendo também. A cada pouquinho que ando, me vejo em várias idades”.
Ainda sorrindo, disse que te via quando era criança. Estava emburrado, mas que mesmo assim, brincava comigo. Com delicadeza pedi para que tirasse as mãos dos meus olhos e que também fechasse os seus.
Relutante, fez o que pedi e pegou despretensiosamente na minha mão. “É para a gente entrar na mesma história”, se justificou. E lá estávamos nós, com os dedos entrelaçados e na espera que esse simples gesto unisse a nossa imaginação.
Apertando meus dedos, falou que estava vendo o dia em que nos tornamos amigos e que depois chorávamos porque não conviveríamos mais, já que o ensino médio tinha acabado.
De fato, cada um seguiu a sua vida. Fiz tantos cursos, trabalhava todos os dias da semana e era quase um milagre tirar férias. Você trocou a cidade pelo campo e me oferecia teto quando resolvia aparecer.
O céu estava alaranjado logo que abrimos os olhos. Ainda de mãos dadas, levantamos e me levou até o carro. Abriu a porta para mim, me deu um abraço apertado e disse que já estava com saudades.
“Quando sentir minha falta, feche os olhos e pense em mim. Pense no que estou fazendo, no que aconteceu no dia de hoje e em tudo o que já vivemos. Quem sabe assim volto mais rápido, quem sabe assim você nem repara no tempo e se aproxima de mim.”
Entrei no carro com a promessa de fazer à mesma coisa. Liguei o motor, pisei no acelerador e já indo embora, olhei no retrovisor. E lá estava você, de olhos fechados...
De olhos abertos ou fechados, te levo comigo – pensei.
2 comentários:
Ultimamente cada texto tem sido mais lindo que seus antecessores, você cala fundo com todos eles, Gabi.
Parabéns!
Obrigada por comentar sempre, Dré.
Acho que tô na melhor fase da escrita.
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