Olavo, 40 anos, morador da Rua Onofre sofreu uma parada cardíaca nessa sexta-feira, 13. Deixou de herança um par de óculos, dois livros do Machado de Assis e uma carteira com cem contos de réis.
Sem mulher e filhos para velá-lo, foi enterrado no cemitério da cidade de Coimbra. O cachorro Oliver e os vizinhos foram os únicos que compareceram ao funeral.
Dizem as más línguas do bairro que a solidão foi uma das causas da morte dele. Outros comentam que ao bebericar de bar em bar, acabou doente dos rins e como era cardíaco, o coração não resistiu.
De certo, Olavo já não estava muito bem. Nós nos conhecemos em um banco de estação. Lembro-me que ele lia um livro no qual, agora não me recordo o nome. Cabisbaixo, interrompeu a leitura e contou-me sobre a mulher que o abandonara e os filhos que não tivera.
Desafortunado, era um doce rapaz. Fato que contribuiu para que minha paixão fosse instantânea. Por isso, por infinitos dias e noites eu o amei. Era correspondida de fato, mas cansada de perceber que ele procurava em mim as características da antiga mulher, o abandonei.
Sem dar satisfações, peguei tudo o que me pertencia e saí de casa sem escrever um bilhete se quer. Troquei o número de telefone, arranquei da agenda os possíveis lugares que ele me encontraria e decidi que meu destino seria incerto.
Depois de muitas semanas, regressei à Coimbra. Antes mesmo de chegar até a casa onde morávamos, trombei com a senhora que reproduzia fielmente o que acontecia nos arredores de sua casa.
“O senhor Olavo da rua de baixo, bateu as botas ontem à noite. Ninguém sabe o motivo. Uns dizem que foi de desgosto. Outros comentam que o álcool o matou”, comentou.
Dei as costas a ela quando senti que o próximo assunto seria eu. Para sair de perto, inventei a desculpa de que visitaria a casa onde morei, onde Olavo morrera.
Paredes verdes, portas marrom. Quintal imundo, jardim mal cuidado. Reflexo de como o interior dele estava. De fato, precisava trocar as mobílias e reformar o lar.
Não fui ao velório, mas desfilei pelas ruas trajada a moda antiga: com vestido preto e com os olhos tapados pelo véu do chapéu da mesma cor.
Renascer.
Um comentário:
O impacto da última palavra é como um tiro à queima roupa. Revira umas coisas, sabe? Porque ela dá ao texto um caráter de expansão, do eu-nós-dentro-do-Olavo, entende? Da necessidade de fênix que às vezes se precisa colocar fora.
Um beijo. Checa a mensagem na rede social.
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