domingo, 16 de maio de 2010

Nome e sobrenome

Diante de todas as circunstâncias criadas pelo destino e divididas por nós, falar da sua partida soa completamente clichê. É como se aquela saudade que nunca senti, agora, recebesse nome e sobrenome.
Engraçado é pensar que nosso romance começou com simples trocas de olhares despretensiosos naquela rodoviária localizada na capital. Por obra do acaso – uso essa palavra porque acredito que só o amor pode ser regido por ela – nos sentamos perto, o que foi o suficiente para trocarmos algumas palavras.
A nossa sintonia ocorreu de imediato. Até parecia que éramos casados, segundo a senhora de cabelos brancos que estava sentada no banco da frente. Não lhe disse, mas concordei com tal afirmação e foi a partir daí que certa parte da minha vida se perdeu.
Tínhamos destinos diferentes, mas por causa de nossa conversa, descemos na primeira parada. De fato, estávamos perdidos. E sem nossas malas para contar história.
Interessante era a segurança que sentia quando estava perto de você. Uma hora de conversa e levou consigo a confiança de uma vida inteira. A verdade é que estávamos buscando um lugar para ficar. Uma simples xícara de café e tentaríamos ir embora.
Ao longe, avistei um prédio cinza. Tudo indicava que era um hotel ou algo semelhante. Você achava que aquilo era uma cafeteria. Entramos.
Ambiente escuro, sem nenhum sinal de vida. Parecia algum estabelecimento desativado. Queria sair, mas você tinha me dito lá no ônibus, que gostava de certo mistério e não tinha medo de quase nada. Independente do que aparecesse na nossa frente, certamente, você enfrentaria.
Notando minha insegurança e em um ato impulsivo de sua parte, senti nossas mãos se juntarem. As suas estavam quentes, tentando esquentar a todo custo as minhas que estavam frias e trêmulas.
Pedi para sairmos dali. Saímos abraçados. Juntos, como se fossemos um só. Já era noite e nossa volta foi adiada para o dia seguinte. Dormimos no banco da praça debaixo de sereno, e completamente cobertos pela blusa que você carregara o caminho inteiro.
Aos poucos a lua cheia trocava o turno com o sol. E foi ai que me deparei com a solidão. Abri os olhos e não lhe encontrei. Vi ao longe a polícia te levar embora, algemado.
Na minha mente tudo aquilo era apenas um mal entendido. Fui perguntando pelos arredores onde ficava a delegacia. Um senhor bondoso, dono do principal bar daquela cidade me disse o trajeto.
Com passos largos, em menos de dez minutos cheguei ao lugar que procurava. Entrei desesperada e logo chamando por você. O delegado, pessoa simpática, me disse que você havia me enganado e que estava foragido por mais de sete anos. E que era uma sorte eu estar viva.
De fato, você tinha nascido naquele lugar e notando que já tinha gastado todas as possibilidades de roubo, simplesmente resolveu mudar de ares. E cai na sua conversa. Fui cobaia da sua volta. Acreditei em todas as palavras que foram ditas. E apesar de tudo, depois de anos, agora, sentada no sofá, ainda sinto sua falta. Algo ali foi verdadeiro. Até hoje sinto isso. A nossa paixão poderia ter dado certo...

Suspiro.

5 comentários:

Unknown disse...

Linda história! Gostei muito muito muito muito!

Ludmila Castro disse...

tem um selo pra você no meu blog http://migre.me/FpKG

André Luiz . disse...

Uau! Me surpreendi com essa história!
Parabéns Gabi, tudo o que escreve é adorável!

neusa disse...

Oi Gabi; escrever: é um dom que poucos têm, primeiramente porque tecer estorias ou contar algo já é um tanto quanto dificil; prender o leitor com um certo suspense que se desvenda aos poucos muito mais. Seus textos são interessantes quando se inicia vem uma certa vontade de saber desde logo onde vai dar, de descobrir de imediato qual o sentido de cada frase, sao um pouco triste tambem. Uma linguagem atual um portugues escorreito. Paraben

Unknown disse...

Juro que me surpreendi a cada palavra, o desfecho dessa história pode ter sido triste, porém foi surpreendente. Não poderia mesmo imaginar que o cara em que tanto a garota descrita por ti se identificava era um criminoso fugitivo. É isso que eu gosto nos textos que tu escreves, além de uma beleza infinita tens o dom de surpreender o leitor a cada linha escrita. Beijos, querida.